O Pão Que Perece


         Em João 6 há o relato do que aconteceu às margens do mar da Galiléia, na localidade de Tiberíades. Uma multidão estava ansiosa para ouvir os ensinamentos de Jesus. E durante o dia inteiro ouviram suas palavras. Ao findar do dia, Jesus multiplicou peixes e pães e alimentou a multidão. Logo após, foi-se a uma montanha, e ao entardecer atravessou o lago (uma parte andando sobre o mar) indo até Cafarnaum. No dia seguinte a multidão O encontrou lá. Jesus fez, então, uma colocação que serve de titulo para a presente mensagem:
 
"Em verdade, em verdade vos digo que me buscais, não porque vistes sinais, mas porque comestes do pão e vos saciastes".

         A multidão estava interessada em comer pão de graça. A possibilidade maior é que tenha acreditado que se fizesse Jesus Rei então Ele faria cair pão do céu como acontecera com os hebreus que saíram do Egito. É sobre isso que gostaria de discorrer nesta oportunidade: relacionamentos baseados no egoísmo.
         Em Atos 20:35 a Bíblia diz que mais bem-aventurado é dar do que receber. Mas a sociedade moderna (inclusive a eclesiástica) pensa (e faz com) que seja mais bem-aventurado receber do que dar. Nos filmes, nas novelas, nas matérias de jornal há varias referências parecidas com "a quem interessa tudo isto?", ou "quem sai ganhando com esta situação?". Isto é, as análises são baseadas no egoísmo. Por que fazem tais análises? Porque o egoísmo é mola mestra que impulsiona o comportamento humano. Para os catedráticos fica mais digerível se colocarmos a dicção de Carl Marx:
 

"todas as atividades humanas são circunstanciais à atividade econômica" (ou coisa parecida).    Carl Marx


         Talvez "egoísmo" soe muito... forte. Podemos colocar também "interesse pessoal" que dá no mesmo. O fato é que os membros de nossa sociedade são movidos pelo lucro pessoal, pela realização dos desejos, dos sonhos, dos anseios e das aspirações. Querem ser felizes de um modo egocêntrico e egoísta. Já ouviu a expressão "ninguém faz nada de graça"? Pois é... esse é mundo em que vivemos...
         Lembro-me de uma cena de novela protagonizada por Nívea Maria e Reginaldo Faria. Ela diz para ele que se eles não fossem se consultar com um psicólogo de casais, ela não continuaria INVESTINDO naquele relacionamento. Isso mesmo: investindo! Ora investimentos são aplicações que geram LUCRO. A personagem dela acreditava que não estava tendo o lucro (ou o retorno) satisfatório (um mínimo exigível) para continuar junto ao seu marido. E esta não é uma situação isolada. Mesmo que não tenham consciência a maior parte dos relacionamentos parte do principio de que ambos devem ganhar com o relacionamento. O problema está em se quantificar "o que e o quanto" ganhar. Como somos mesquinhos e egocêntricos... a impressão que temos é que estamos sempre perdendo, que não estamos recebendo o que merecemos e que estamos dando mais do que deveríamos dar. Assim, é comum e freqüente o sentimento de injustiça que estamos sempre declarando ao dizer, por exemplo, que fazemos muita coisa e nossas companheiras (inclusive de matrimônio) fazem muito pouco, ou quando jogamos (principalmente as amadas irmãs...) na cara de outros seus erros, seus defeitos e seus vícios (principalmente quando de se trata de seus maridos), enquanto defendemos, justificamos, racionalizamos e explicamos os nossos próprios erros, defeitos e vícios.
         Em nossos relacionamentos, repita-se, usamos uma boa (e grande) dose de egoísmo sem nos dar conta. Enquanto achamos que estamos ganhando o suficiente (até empatar) continuamos com o relacionamento. A partir do momento em que acreditamos que o prejuízo está sendo maior do que o lucro, então as brigas e os... "descompassos" começam... essa é a ótica, repita-se, humana, carnal e egocêntrica que impera no mundo, e que tem penetrado em nossas igrejas.
         Sobre a injustiça, permita-me abrir um parêntese: um estudioso das ciências sociais fez a seguinte colocação: "a justiça do oprimido é a injustiça do opressor e a justiça do opressor é a injustiça do oprimido". Tomei da liberdade de trazer essa máxima para uma linguagem mais coloquial, mais próxima ao nosso dia-a-dia e formulei a seguinte máxima:

"quem paga sempre acha que está pagando demais, por menos que esteja pagando; e quem recebe sempre acha que está recebendo de menos, por mais que esteja recebendo".

 
        Partindo dessa ótica carnal e vendida sob a escravidão do pecado não é com dificuldades que se conclui que jamais vamos nos sentir satisfeitos com o que nos é dado, com o que nos é oferecido, com o que recebemos... e o não-reconhecimento dessa situação pecaminosa do ser humano (todos nós) tem levado ao naufrágio milhares de relacionamentos e feito com que essas pessoas se fechem num mundo de rancor e... solidão!
         Aliás, este é o resultado final de todos aqueles que cultivam seus relacionamentos baseados no egoísmo (vós me buscais por causa do pão que perece!). Isto quer dizer que se Jesus tivesse dado o pão que aquela multidão queria ter de graça em pouco tempo eles iriam querer outras coisas, desprezando o pão, como aconteceu também ao povo hebreu (Nm.21:5).
         ... e essa cultura tem sido levada para dentro das igrejas. Alguns, ainda que embalados pelo desejo de servir ao Senhor, cultuam essa forma de pensar e agir ao instituir premiações em concursos e competições. Isso acaba criando duas categorias dentro da igreja: os melhores (que ganham prêmios) e os piores (que nada ganham). Entende o que quero dizer? Ouso afirmar que há uma boa parte dos freqüentadores de nossos cultos dominicais que também estão atrás do que podem GANHAR estando na igreja... estão atrás de seu interesse pessoal. Estão na igreja somente enquanto acreditam que estão ganhando nessa relação. A partir do momento em que passam a acreditar que estão tendo mais prejuízo do que lucro abandonam a igreja. São as sementes que caem nos pedregais e cujas plantas não suportam a perseguição ou a tribulação (Mc.4).
          Permita-me fazer uma indagação sobre a situação em apreço: o que Jesus ganhou vindo habitar conosco? O que Jesus ganhou dando a sua vida pela nossa redenção? Já refletiu sobre a dor, o sofrimento, a angústia, o desespero, a solidão, que Jesus sentiu ao ver a multidão que dias antes gritava: "hosana ao vem em nome do Senhor""seja seu sangue sobre nós" (Jo.12) gritando (Mt.27)? Nem aqueles a quem Jesus havia curado, purificado de demônios, ou ressuscitado, estavam com Ele...
         João 3:16 é o primeiro versículo que a maioria dos cristãos decoram. Mas poucos, muito poucos decoram, e menos ainda incentivam que se decore I João 3:16.
         O pão que perece tem sido oferecido por alguns pseudo-pregadores da palavra de Deus como atrativo aos que NÃO estão cansados deste mundo (Mt.11:28-30) e aos que NÃO têm sede de Deus (Jo.7:37). Eles não querem a salvação, ou a reconciliação com Deus, ou a comunhão com o Santo Espírito de Deus. Querem sucesso na vida financeira, amorosa e profissional, e a solução de seus problemas. Isto lhe soa familiar?
         O(a) amado(a) leitor(a) está na igreja em busca do pão que perece ou do pão que permanece?
         A gravidade da resposta revela a gravidade da pergunta.
 
"Não ameis o mundo, nem o que há no mundo. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não vem do Pai, mas sim do mundo. Ora, o mundo passa, e a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de Deus, permanece para sempre." (I João 2:15-17)



Autor: Takayoshi Katagiri